Havia uma casinha branca, de esquina, voltada para os matos do Jardim Sepol. Na frente dela, uma barraca com uma porta que abria para cima, ao lado um pé de jambo, e debaixo dele uns homens que jogavam dominó. Antonio Doido, que morava mais abaixo, trazia os recados e ajudava nos preparativos para a festa de logo mais. Era o nosso réveillon nos tempos de Seu Cabral.
A vizinhança fazia fila para comer carne assada, a churrasqueira de ferro funcionava a partir das 7 horas noturnas, Cabral todo de branco, os óculos descendo pelo nariz, se multiplicava em gentilezas. Era um líder político, e, como tal, atendia a todos com o coração aberto.
A vizinhança também festejava. Festa simples, de gente simples, parecia festa de interior. Nada de queima de fogos, as pessoas ali sequer escutavam os estampidos vindos da praia. A hora dos abraços era ditada pela TV. Primeiro acontecia a corrida de São Silvestre, que terminava exatamente a meia noite, quando o ano velho se ia e o novo botava a ponta do nariz na colina do Roda Viva.
Aí o champanhe pipocava, meu cunhado Neto, já pra lá de Bagdá, abria um olho e fechava o outro, eu também não administrava cem por cento as pernas bambas, mas todos nos perfilávamos ao lado da mesa para escutar o discurso anual de Seu Cabral, o comandante em chefe da prole.
E o velho, vermelho feito pimentão maduro, encerrava sua eloquência, repetindo: “Mais um ano se foi e eu não queimei o fuzí”.
Faz 12 anos que Cabral “queimou o fuzí”, a casinha branca fechou as portas, cada um foi morar em endereço diferente e não tivemos mais as festas do Ernani Sátyro.
Na saudade de hoje, vou lembrar de Seu Cabral aqui em casa mesmo, olhando o vazio da mata ali defronte e ouvindo os tiros dos fogos lá na cumieira da serra.
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4 Comentários
Saudades e gratidão aos meus pais.
Eita Tião é cada estoria que voçe~conta que chega a nos emocionar,que coisa linda recordar.
Tião , quem era o senhor Cabral ?
Meu sogro