opinião

A ESCOLA: UM ESPAÇO DEMOCRÁTICO

16 de abril de 2023

 

POR GILBERTO CARNEIRO

 

ACORDO todos os dias as 6:30 para deixar minha filha caçula na escola. No começo encarava como uma obrigação, mas com o tempo passei a usar este momento para desenvolvermos diálogos sobre os mais diversos assuntos, afinal são conversas difíceis de ser mantidas durante a correria do cotidiano.

 

Um outro dia, ao chegar atrasado para buscá-la a porta do carro foi batida com excesso de força, e antes de ouvir meus protestos, foi logo perguntando: – “papai, quem foi o herói da guerra de Tróia?” – “Aquiles”, respondi de inopino, lembrando da versão do calcanhar – “resposta errada papai. Foi Heitor”. Então me deu uma aula de História explicando que Aquiles, embora a literatura e o cinema o retratem como herói, não passava de um mercenário que lutou à guerra de Tróia, com seus mirmidões, por dinheiro, enquanto Heitor lutou pela defesa de princípios e por uma causa.

 

Reservei-me à minha ignorância e fiquei atento a sua preleção. Embora ainda nos seus inocentes 12 anos percebi que a educação recebida a permite diferenciar informação qualificada da notícia rasa das redes sociais. E trouxe uma preocupação atual que me inquieta: – “papai, por que estão acontecendo esses ataques nas escolas?” Estava refletindo sobre a resposta quando interveio, com uma segurança que me orgulhou: – “está faltando EMPATIA nos jovens de hoje, papai”.

 

Provavelmente os seus cultos professores devem ter lhe ensinado este conceito para que a própria respondesse com sabedoria um questionamento que atormenta pais, alunos e profissionais da educação nos dias atuais. São múltiplos os fatores que ensejam esses ataques. Um deles é o buling. Os jovens de hoje, em sua maioria, vivem em uma bolha alimentada pelas redes sociais. As informações superficiais que recebem os tornam vagos fechando-os em grupinhos, insensíveis à necessidade de interação com os demais, resultando em distúrbios comportamentais na esfera psicológica destes jovens segregados. Por esta razão, defendo uma regulação urgente das redes sociais individualizando responsabilidades das empresas responsáveis pela divulgação dos conteúdos e, que seja logo, antes que esse tal de metaverso predomine sobre as relações sociais presenciais.

 

É uma situação em que não há heróis ou vilões. Todos são vítimas de um sistema perverso. Na hipótese do buling tanto vítimas como agressores são jovens que passam por problemas psicológicos ou que sofrem agressões no ambiente familiar e na própria escola, e tentam transferir os seus traumas por meio da agressividade contra os outros.

 

Nos últimos anos um outro fator que acaba sendo associado ao buling ganhou relevo. A escalada de discursos de cunho violento, autoritário, ultraconservador e fascista. Tornou-se comum pais e jovens simulando “arminhas” em gestos carregados de simbologia que incentivam comportamentos agressivos. Dos 22 atentados de violência extrema que aconteceram em instituições de ensino no país, mais da metade foi registrada de 2017 para cá e a grande maioria dos agressores adepta do discurso armamentista. São fatos, não insinuações. Fico feliz que essas tragédias não aconteçam em outros espaços públicos, como shoppings centers, por exemplo, mas me faz ver que não é uma mera coincidência ou um fruto de uma escolha aleatória. Essa não é uma violência na escola, mas, sim, uma violência à escola, pois na linha do pensamento de Marcele Frossard, pesquisadora nas áreas de sociologia da educação e sociologia da violência: “isso está relacionado ao ódio às minorias e à aproximação de teorias ideológicas fascistas e nazistas. As escolas são ambientes amplamente democráticos e espaços com grande diversidade. Atentar contra elas também é uma forma de atentar contra a democracia”.

 

Acrescente outro artefato nesta modelagem de bomba relógio: O excesso de competitividade nas escolas. Basta percorrer os principais corredores da cidade e a quantidade de outdoors exaltando a competição entre “as melhores” escolas pagas nos mostra o quão cruel é este modelo para a saúde mental dos nossos jovens e adolescentes. Existem escolas que ao invés de combaterem a segregação as MOTIVA, criando turma de alunos notáveis. É preciso urgente reavaliar seus modelos de convivência criando métodos de escutas, ativa e empática.

 

Todos os dias no itinerário para a escola eu e minha filha conversamos muito. Na medida do possível faço-a valorizar princípios de política de inclusão e respeito à pluralidade de ideias, firmando suas convicções, porém respeitando as diferenças, a diversidade e as minorias. Não apenas conversamos, reservamos um tempinho do trajeto para rezar e, pedirmos a Deus, com as forças do meu combalido coração, que nos proteja de todo o mal, dentro e fora do ambiente escolar, ela e todos os alunos, pais, professores e demais profissionais da educação que vivem atualmente sob um estado de tensão permanente.

 

Como asseverou Ana Julia: busquemos a EMPATIA.

 

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3 Comentários

  • Reply Edgley Lopes 16 de abril de 2023 at 12:26

    Ótimo texto, parabéns ao blog por essa coluna… Sempre assuntos importantes com abordagem simples e direta.

  • Reply Valdice Gama 16 de abril de 2023 at 16:17

    Eis questões importantes para toda a sociedade, ótimo que você exemplifica que começa na micro sociedade.

  • Reply Sebastião Gerbase 17 de abril de 2023 at 05:53

    Parabéns por tão produtivo diálogo matinal.
    Se a maioria dos pais assim agissem, o futuro de nossas crianças não estaria tão incerto, inseguro, sob tensão.
    Nota 10 para pai e filha!
    Basinho

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