RAMALHO LEITE
Na última quinta- feira ocorreu o lançamento do livro A História Como Eu Conto. A confreira Zélia Almeida, do IHGP, fez a apresentação do meu trabalho. Poderia resumir aqui o acontecimento. Todavia, resolvi abrir espaço para os comentários de um querido amigo que como ele mesmo diz, nem sempre estivemos “lado a lado”, o que não diminuiu a estima que penso ser recíproca. Seus irmãos José Souto e Benedito marcaram época no jornalismo paraibano. Paulo José de Souto, que preferiu ser engenheiro, revela-se, contudo, um ótimo escritor. Cedo-lhe hoje esse canto de página.
Meu caro Severino,
Prefiro externar numa ‘missiva’, com forte ‘amplexo’ os cumprimentos pelo seu ‘A história como eu conto’, crônica de fatos históricos escrita com ‘estilo gracioso e feroz ironia’, no dizer de Zélia Almeida.
Não vou cair no ridículo de pretender fazer crítica, porque o máximo que alcançaria seria um lugar como coadjuvante no mesmo patamar que você destinou ao poeta Manoel José de Lima, no seu discurso de lançamento do ‘O poder do bom humor’.
Nesse campo, prefiro, se for o caso, errar com os outros a acertar sozinho. Por precaução, me escudo nas análises de ‘experts’ como Juarez Farias, Gonzaga Rodrigues e Biu Ramos sobre outros escritos seus e transcritos nas páginas do livro. Para não correr o risco de errar em seara alheia, ‘acompanho o voto dos relatores’ acima citados, o que me dá a certeza de acertar na mosca.
Li o livro como não se deve fazer, lendo-o de cabo a rabo, com sofreguidão, por culpa do ‘estilo gracioso’ do jornalista nato, diferentemente, dos noticiaristas de hoje, que propagam as novas de forma carrancuda ou força desproporcional, quando escritas. Ao invés de degustá-lo pausadamente como se faz com os bons vinhos (segundo os enólogos), sorvi-o de uma tacada como se faz com uma lapada de cachaça, sem a finesse necessária para me deleitar com a forma e saborear o conteúdo dessas estórias compiladas com argúcia e contadas com a sensibilidade que só o tempo nos ensina a cultivar.
Certa feita o escritor maranhense Josué Montello afirmou que qualquer artigo de nosso Código Civil poderia ser tema de um romance. Desafiado, escreveu o romance a Décima Noite, baseado no artigo 178, do então vigente Código Civil.
Você, caro Ramalho, nada afirmou, nem se sentiu desafiado. Deixou de lado os considerandos e foi direto ao finalmente, no dizer do bem-amado Prefeito de Paraguaçú. Dedicou-se à difícil tarefa de garimpar entre tantos fatos do cotidiano de nossa História, alguns que poderiam ser tema de uma crônica. Escolheu-os e, literalmente, pôs mãos à obra e criou ‘A história como eu conto’.
Dos muitos pontuais eventos e passagens escolhidas para propiciar uma reflexão e dela nascer uma crônica, duas mereceram particular atenção da minha parte. Não pela espetacularização que a mídia possa a elas ter emprestado ou por sua importância histórica, propriamente dita. Talvez até pela singeleza de uma e pela controvérsia da outra, tenham elas me chamado a atenção.
A primeira foi ‘O regimento das escolas no tempo do império’, na qual você destaca: ‘Em Província nenhuma do Império são eles (os professores) remunerados como na Paraíba’. No longínquo ano de 1861, os mestres-salas da Paraíba recebiam os mais altos salários do Império. Dos governos em que servi ocupando Cargos de confiança, foi o Governo Ivan Bichara/Dorgival Terceiro Neto o que mais se preocupou com a situação financeira dos docentes paraibanos. Após aquele período, a retribuição aos nossos educadores públicos estaduais foi descendo ladeira abaixo, com algumas exceções, até alcançar os níveis hoje praticado s. Talvez valha, então, a máxima: Em Estado nenhum da República são eles (os professores) remunerados como na Paraíba.
A outra foi ‘Os delatores, desde Judas, passando por Calabar’. Por fim, encontrei alguém, mesmo que de forma suave e sutil também vê, como eu, com reservas o uso indiscriminado da delação premiada. Diferentemente das delações torturadas do golpe militar de 64, que roubaram a vida dos Herzogs, Manoel Fiel, Rubens Paiva e tantos outros desaparecidos nos porões da ditadura, as delações de hoje atentam contra a democracia, não ajudam no combate à impunidade e contradizem a máxima de que o crime não compensa.
De uma coisa tenha certeza, essas despretensiosas observações são do leitor comum, pouco letrado, público ao qual, mais se dirige os escritos do repórter que você nunca deixou de ser. São, portanto, sinceras. Não tenho e nem posso ter a veleidade dos críticos, esses sim, obrigados às análises de forma e estilo para ajudar na nossa educação literária, nem a cumplicidade de seus admiradores mais próximos, fiéis à amizade que lhe devotam.
Caro Ramalho Leite, desculpe, ‘as mal traçadas linhas’, e obrigado pelo involuntário e belo presente de Páscoa que você me deu ao presentear-me de forma inusitada com o seu ‘A história como eu conto’, antes do lançamento e sem dedicatória. Quem sabe, para se desculpar pelo banho de chuva que tomei por ter você me trancado num estacionamento, infringindo o Código Nacional de Trânsito.
Feliz Páscoa e um forte abraço ao companheiro, nem sempre lado a lado.
Paulo Souto.
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