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AS LÁGRIMAS DO DEFUNTO

8 de agosto de 2021

Quando Seu Neco morreu, a comoção  não foi por causa da morte em si, mas pelas circunstância como se deu.

Homem caseiro e pacato, temente a Deus, frequentador assíduo de missas e novenas, era um exemplo a ser seguido por todos aqueles que primavam pelo bem da família e dos bons costumes.

Sapateiro de profissão, sem vícios, sem nada que reprovasse seus atos, era alvo de citações das beatas fofoqueiras que viviam a azucrinar a vida de notívagos incorrigíveis como Antonio Coxilha, Toga Hora Morta, Chico de Anjinha e Antonio Carga Torta, notórios raparigueiros e notáveis divulgadores das amigações com raparigas difamadas pelas religiosas de plantão.

Mas Seu Neco morreu. E morreu de modo comprometedor.

Encontraram-no morto em cima da Nêga Bola, depois de uma foda galopante e de um orgasmo que lhe estourou as veias do coração.

Bola nem teve tempo para fugir do embaraço. Só lhe foi permitido ver a cara do amante em profundo gozo, os olhos estufados, a boca aberta, o ronco vindo da alma e o baque em cima dela.

O cabaré da Rua da Lapa  viveu o maior alvoroço. Afinal, não era comum morte daquele tipo. As putas e frequentadores conheciam os que morriam de tiro, de faca e de paulada.

Não fazia uma semana, na poeira da rua ficara estatelado Chico Coco, emérito senhor de rapariga amigada, com direito a teto, cozinha e quarto perpétuos na casa da acesa Lurdes Branca. Alguém chegou na boca de noite e encontrou Chico matando as horas na preguiçosa armada na calçada da casa. Dali mesmo foi tirado da vida. Três tiros certeiros acertaram na caixa dos peitos e o levaram para o outro mundo.

Deve ser dito que Chico vivia de saldo médio, já que escapara de mortes anteriores, talvez até mais perigosas do que a consumada. Toinho Mandau arrancou suas tripas a facadas numa briga de pif-paf. O coitado foi levado numa cadeira, sentado e quatro pessoas carregando e uma quinta pessoa segurando o fato do pobre para não cair no calçamento. Doutor Severiano botou as tripas de volta, costurou o buraco e Chico se salvou. Para morrer de bala, que era e é morte mais chique, a altura da nobreza do filho de Cassimiro Coco.

Voltando a Seu Neco, deve ser dito que o maior problema enfrentado pela família não foi a morte em si, devidamente acoitada pelo pessoal da igreja.

Ao morrer “daquele jeito”, seu Neco não conseguiu amolecer o que estava duro. E deixou para os herdeiros o problema quase insolúvel: abaixar a ferramenta para permitir o fechamento do colchão.

Sugestões foram feitas, soluções apresentadas, mas nenhuma delas resolvia o caso. Chicão do Ò, fabricante do caixão, afirmava que mesmo fazendo uma alteração na tampa, haveria de ficar o boato daquela parte mais alta, em formato suspeitoso, que cobriria os excessos do defunto.

Até que surgiu a sugestão apresentada por Chico Pedro, após o consumo de cinco garrafas de Pitu: Cortar a rola do morto e enfiá-la no cu.

Sugestão acatada por todos, inclusive pela viúva.

Seu Neco é que, aparentemente, não gostou, pois quando a parte cortada lhe foi devolvida ao “fundo”, duas lágrimas pesarosas escorreram pelas suas faces.

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2 Comentários

  • Reply Airton Calado- Campina Grande 9 de agosto de 2021 at 11:00

    Kkkk, que estória

  • Reply Valmir lopes 9 de agosto de 2021 at 12:29

    História sensacional

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