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Cícero “Estrelinha ” de Adauto

30 de março de 2021

Cicero de Adauto era pabuloso, mas sua pabulagem era divertida e inofensiva. Quem escutava as suas bravatas, gargalhava e pedia bis. Somente uma vez ele passou da palavra à ação, quando a moça a quem declarou amor respondeu com um não desdenhoso. Inconformado, furou-lhe a bunda com um tiro de chumbinho. A moça escapou, tudo se acalmou, mais tarde namorou e casou, teve filhos e netos, foi feliz, mesmo carregando no corpo a marca de um amor que não deu certo.
O “Estrelinha” apareceu no nome por acaso, sem origem, sem padrinho. Alguns dizem que o próprio o criou. Mais por modéstia, pois o seu tamanho era tanto, apesar da estatura pequena, que não seria exagero batizá-lo com uma constelação inteira.
“Pistoleiro” famoso, gabava-se de ter matado mais de 20, embora poucos tenham conhecido uma só de suas vítimas.
Afirmam os mais velhos que ele as enterrava na enseada da Brauna de Antonio Medeiros, numa grota escura onde moravam as almas penadas da cidade. Por isso o desconhecimento, a falta de pistas na apuração das mortes, a impotência declarada da polícia.
A marca da sua personalidade era um bigodinho fino por cima do beiço e um cigarro de fumo que costumava baforar na esquina de Adauto, seu pai, enquanto rememorava seus feitos por mares bravios e caatingas incendiárias.
As suas armas eram sempre uma faca pequena e uma bala de 38. “Cadê o revólver, Cicero?”, perguntava o curioso. E ele, já babando de valente: “O revólver está aqui”, e exibia um volume imaginário no lado direito da cintura.
Quando acordava aborrecido, botava a cara pra fora de casa anunciando em voz alta: “Hoje eu mato um”. E saía a procura da vítima. Uma mocinha da vizinhança passou três dias sem sair de casa, depois que Estrelinha prometeu sequestrá-la. Fez a promessa e disparou três tiros com a boca.
E os ditos que soltava, pegavam como sentenças eternizadas: “Sou pequeno, mas sou intérado”, costumava dizer a Zé de Biu, antes de pedir uma lapada de Pitu.
Mas o mundo escurecia, os trovões abriam o bucho do céu, o cancão piava e o jumento relinchava mesmo era quando ele se encontrava com o negro Pula, seu maior rival. A Polícia corria com medo e o tiroteio comia no centro.

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