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Desembargador anula decisão de juíza e cartazes contra atos de homofobia voltam a ser obrigatórios em estabelecimentos comerciais e repartições públicas

26 de julho de 2018

O desembargador Marcos Cavalcanti conheceu agravo de instrumento apresentado pelo Estado da Paraíba, através da Procuradoria Geral do Estado, e anulou a decisão da juíza da primeira Vara da Fazenda Pública, que suspendera a validade da lei 10.897/2017, aquela que obrigava a afixação de cartazes em estabelecimentos comerciais e órgãos públicos das administrações direta e indireta, com a advertência de que discriminação em virtude de orientação sexual é punida com aplicação de multa.

A lei fora suspensa a pedido de alguns estabelecimentos comerciais.

Nos argumentos que utilizou para suspender os efeitos da decisão da juíza, o desembargador Marcos Cavalcanti pontuou:

“A Constituição Federal estampa em seu texto, como princípio fundamental, a dignidade da pessoa humana. Dessarte, essa condição de princípio fundamental não corresponde à mera declaração de conteúdo ético e moral, mas, sim, à norma jurídico-positiva, dotada de status constitucional formal e material e, dessa forma, carregada de eficácia.

Importa observar que a pessoa humana e sua dignidade estão afirmadas ainda em outros pontos da Carta de 1988, como na regulação da ordem econômica e financeira e na regulação da ordem social. Mas em todas as dimensões constitucionais, a centralidade da pessoa humana e sua dignidade estão explícita ou implicitamente asseguradas’.

Desta forma, no caso em questão, a vulnerabilidade apresentada por um grupo minoritário frente a arbitrariedade de tratamento decorrente de sua orientação sexual ou identidade de gênero, apesar de residir numa esfera eminentemente privada, pressupõe uma atuação estatal que potencialize a efetividade de um princípio consagrado constitucionalmente, como dito alhures, a dignidade do ser humano.”

Nelson Rosenvald, discorrendo acerca do direito de personalidade, desta forma pontuou:

DELGADO, Mauricio Godinho. Constituição, Estado Democrático de Direito e Direito do Trabalho. Revista de Direito do Trabalho, a. 38, v. 147, jul./set. 2012.

Processo n°. 0803946-26.2018.815.0000

“Dentro de nós há uma coisa que não tem nome, essa coisa é o que somos. O escritor José Saramago demonstra a incongruência de se fraturar o valor unitário da pessoa humana. Tal e qual se vê na recente afirmação do direito de personalidade ao cuidado (decorrente da responsabilidade parental), ao esquecimento (no contexto da intimidade na era do superinformacionismo) e à orintenação sexual (não como opção, mas como destino), a atualização da dignidade da pessoa humana permite que venham à tona dimensões até então inomináveis das múltiplas manifestações do ser, entre as quais se afirma a inserção da pessoa em sua identidade pessoal.'”

De outra banda, a concepção da igualdade como reconhecimento sanciona comportamentos que estigmatizam grupos sociais minoritários de forma a lhe denegar o valor intrínseco reconhecido a outras pessoas’. Nesse caso, o que vem a destaque é a igualdade material, já que a formal é absoluta em termos jurídicos e alheia às circunstâncias pessoais.

Para realçar esse entendimento, segue o excerto abaixo, dos ensinamentos do Prof. Nelson Rosenvald:

“A dimensão material da igualdade se amplia no constitucionalismo contemporâneo para forjar uma igualdade social ou, de fato, apta a agasalhar um dever de compensação de desigualdade em prol de determinados grupos de pessoas, versados em cláusulas especiais de igualdade, como a que se insere no art. 30, IV, da CF, demarcando entre os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil o de ‘promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação’. Com efeito, políticas de ação afirmativa (ou discriminação inversa) são fundamentais para a promoção do direito à identidade sexual diante de uma discriminação indireta, verificável no momento em que medidas aparentemente neutras do ponto de vista discriminatório acarretam efeitos nocivos e especialmente desproporcionais quando da sua incidência em detrimento de determinadas

7  Salomão, Luis Felipe e Tartuce, Flávio Direito Civil – Diálogos entre doutrina e jurisprudência. 1. ed. São Paulo: Atlas, 2018. 7  Idem.

Processo n°. 0803946-26.2018.815.0000

categorias de pessoas.”

Assim, a afixação do cartaz com a dimensão de 50 cm x 50 cm, não possui o condão de violar o princípio da livre atividade econômica, já que não interfere na atividade comercial, consequentemente, não gera dano. E, ainda, não fere o principio da igualdade, pois “dar tratamento isonômico às partes significa tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na exata medida de suas desigualdades”.

Neste sentido, a Constituição Federal e a legislação podem fazer distinções e dar tratamento diferenciado de acordo com juízos e critérios valorativos, razoáveis e justificáveis, que visem conferir tratamento isonômico aos desiguais: “Assim, os tratamentos normativos diferenciados são compatíveis com a Constituição Federal quando verificada a existência de uma finalidade razoavelmente proporcional ao fim visado”.

Restando demonstrados a probabilidade do direito, e o perigo de dano, pois a não afixação dos cartazes gera a ineficácia da Lei Estadual n°. 10.895/2017, que busca dar pleno conhecimento e conscientização acerca da existência da Lei Estadual n°. 7.309/2003.

De toda forma, impende ressaltar que a concessão ou denegação da liminar não implica, necessariamente, na antecipação do seu julgamento, tendo em vista que a decisão poderá ser novamente reformada, quando do pronunciamento final da Câmara sobre o presente Agravo de Instrumento.

Feita estas considerações, DEFIRO A ATRIBUIÇÃO DE EFEITO SUSPENSIVO, para suspender a decisão agravada até o julgamento do mérito do presente agravo de instrumento.

Comunique-se, com urgência,  o inteiro teor desta decisão ao Juízo prolator da decisão agravada.

4  (MORAES, Alexandre de. Ed. Atlas. 1989, p. 58).

Processo n°. 0803946-26.2018.815.0000

Intimem-se as partes agravadas para, querendo, oferecerem resposta ao recurso, nos termos do art. 1.019, II, do CPC/2015.

Após, remetam-se os autos para o Ministério Público para emissão de parecer, de acordo com o art. 1.019, III, do CPC/2015.

P. I.

Cumpra-se.

João Pessoa/PB, 26 de julho de 2018.

Desembargador Marcos Cavalcanti de Albuquerque Relator”

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