E lá estava eu voando sobre o Oceano Atlântico. Não com as minhas asas, já gastas e sem uso, mas com as asas do avião português que me pegou em Lisboa para devolver em Recife. Voo longo, de seis horas corridas, sem direito a intervalo ou a um show de Roberto Carlos para quebrar a rotina.
Perto de mim, um casal com gêmeos não parava um instante.Cuidava dos dois recém nascidos, que eram uma atração à parte.
Lá mais distante, um moreno de cabelos longos se aconchegava perto dos ombros de um senhor de barbas brancas, que usava viseira nos olhos para escapar da luz. Acho que pintou um clima.
Fiquei sentado perto do banheiro. Minto, dos banheiros. Eram dois, um em frente do outro. A fila era grande. Mulheres e homens se misturavam democraticamente no vai e vem, no entra e sai. Eu mesmo fui lá três vezes. Não fui na quarta por causa da fila.
E o cheirinho maravilhoso de mijo já começava a aportar nas minhas narinas. Incrível como mijo tem um cheiro só, seja mijo de pobre ou de rico, de homem ou de mulher. E acho até engraçado ver aquelas mulheres elegantes, de bolsas penduradas nos ombros e belos cabelos ondulados e escovados entrarem no banheiro e depois saírem, orgulhosas do que deixaram ali depositado.
De vez em quando a gente flagrava algum descuidado, que esquecia a descarga e jogava o papel toalha no chão. Mau costume, educação de casa fazendo praça nas ruas. Ou nos aviões.
Pelo menos numa coisa os aviões que singram os mares são melhores do que os dos vôos domésticos: servem comida.
O que me levou por cima do mar serviu massa e frango. Na rebarba, um pãozinho engraçado, redondo e duro, acompanhado de um pacotinho de manteiga, uma tira de açúcar e outra de azeite extra virgem.
Como todos sabem, os aviões domésticos, quando não vendem, dão de graça um saquinho insosso de bolacha dura e um copo minúsculo de suco sem sabor algum.
E o cheirinho de mijo aumentando.
Fiquei a imaginar se algum desses usuários inventasse de fazer o número dois.Aí não teria perfume francês que se igualasse. As duas essências juntas são insuperáveis e incomparáveis.
Isso se não botar um numero dois de quilo, como aquele senhor oriental fez na loja da Fiat em João Pessoa.
Os funcionários lotados na recepção começaram a escutar uns gemidos de “ai, Jizus!” e, curiosos, ficaram na porta do banheiro esperando para ver do que se tratava. Depois de minutos e de repetidos “ai Jizus”, saiu de lá um oriental miudinho, de olhinhos apertados, andar ligeiro, suado e apressado.
Ao adentrarem no banheiro, encontraram aquele estrupiço:um tolete do tamanho de um inhame, grosso no dorso e fino na ponta, com quase meio metro de comprimento. O bicho era tão enorme que para descer na descarga teve que ser partido em quatro.
Teve, porém, melhor sorte do que aquele do Gambrinus que olhou para Bibiu meu irmão, botou as duas mãos em volta da orelha e, estirando a língua, zombou: “glu glu glu glu glu glu!”
Levou um tiro na testa que se desmanchou pelas paredes do banheiro.
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