Escutas telefônicas

Marcos Pires

Na sala cheia de equipamentos eletrônicos e centenas de luzinhas piscando, desenvolvia-se a maior campana já montada até então para flagrar as autoridades daquele país em uma operação conjunta da polícia com o Ministério Público. De repente os carreteis dos gravadores começaram a rodar, indicio seguro de que uma Excelência começara mais uma ligação para outra Excelência.

“- Bom dia. Sabe quem está falando, não é?”.

“- Sei, mas estou lhe avisando mais uma vez que desconfio que nossas conversas estão sendo gravadas. Por favor não fale nada que possa nos comprometer. Se houver alguma coisa perigosa só fale em código, entendeu? ”.

“- Claro que entendi. Não sou burro nem idiota. Como você acha que eu cheguei até aqui? ”.

“- Pois bem, diga lá do que se trata”.

“- É que as eleições estão chegando e eu preciso urgentemente resolver muitos problemas na minha região”.

“- Ô meu amigo, isso não é novidade, toda eleição é a mesma coisa”.

“- É, mas dessa vez as empresas estão proibidas de doar dinheiro e o meu eleitorado nunca foi propriamente o povo, se é que você está me entendendo. Eu me expus, votei a favor das reformas trabalhistas, neguei duas vezes licença para processar Sua Excelência, estou praticamente proibido de entrar em aviões porque os passageiros começam a gritar que sou ladrão e que sou golpista só porque obedeci às ordens de vocês e votei a favor da cassação de você sabe quem. E aí, como é que eu fico agora? ”.

“- Ora, meu amigo, tudo o que você fez foi de acordo com a linha programática do partido, não é verdade? ”.

“- Partido o cacete! Vocês me mandaram fazer e eu fiz; agora estou precisando daquela grana prometido para poder comprar meus votos”.

“- Mas o que é isso? Poderemos estar sendo gravados. Fale em código, por favor. Por exemplo, você vai receber aquela ajuda em santinhos, entendeu? ”.

“- Ah, entendi; mas preste atenção, vou falar ainda em código e lhe lembrar que vocês me prometeram cinco milhões de santinhos, não foi? ”.

“- Isso, finalmente você entendeu”.

“- Pois é, agora faça o seguinte; mande metade dos santinhos em notas de cem e a outra metade trocadinho, viu? ”.

Graças a Deus pela estupidez dos políticos.