opinião

Há coisas que nem santo resolve

16 de julho de 2020

Frutuoso Chaves

Postagens sucessivas nas redes sociais alertam os adeptos do catolicismo para a destinação do 16 de Julho à Nossa Senhora do Carmo.

São muitos os tratamentos dispensados pela fé católica a Maria. Conforme a data, as circunstâncias e as súplicas, ela pode ser das Dores, dos Milagres, das Graças, da Misericórdia, da Paz…

No Pilar da minha infância, no alto de uma colina de onde se pode ver os tons dourados que o sol poente imprime nos telhados e nas águas do Paraíba, a mãe de Cristo é da Conceição. Entenda-se o termo por “Concepção”, uma alusão bendita ao fruto que lhe saiu do ventre.

Ali, sua imagem tem abrigo em um monumento de uns 30 metros de altura a si consagrado. Sugeri, em vão, a sucessivos prefeitos o ajardinamento, a iluminação e a instalação de uma balaustrada, com função de mirante, no Alto da Conceição, assim chamado o morro.

Duvido que muitas pessoas em seus trânsitos lá não estacionassem os carros para uma água de coco, um refrigerante ou um café, de modo a aproveitar os últimos raios do dia. A estrada, ao lado, recebeu asfalto até Juripiranga e o ambiente é agradável e repousante.

Gerações sucessivas de pilarenses cresceram com a seguinte história: Um roceiro, há mais de cem anos, ali havia encontrado a santa que logo conduziu ao vigário para entronização na igreja. No dia seguinte, ela desapareceria do altar. Pensou-se em roubo, porém, tempo depois, essa imagem seria reencontrada exatamente no local do primeiro achado.

E lá foi a santa de volta à igreja para novo sumiço, evento que se repetiu três ou quatro vezes, até o entendimento de que ela desejava permanecer, ali, no ponto mais elevado da região, de modo a ter sob suas vistas a cidadezinha e sua população católica.

A realidade, como sempre, não tem os encantos do mito. Contou-me o saudoso Heitor Maroja que o monumento fora construído no final do Século 19 para receber o Século 20, ou seja, de 1899 para 1900. A santa ali entrara por apelo da Arquidiocese, numa época em que nada se fazia sem a presença da Igreja.

Maroja, então aposentado de um dos departamentos da TV Globo do Recife, presidia a Fundação Menino de Engenho, com o objetivo do resgate e preservação de casarios e ambientes do Mundo de José Lins do Rego, em Pilar, a terra natal.

Pediu-me a ajuda nessa empreitada, no tempo em que eu dirigia, em João Pessoa, a Redação do Jornal “O Norte”. Foi ele quem primeiro ouviu minha sugestão acerca do bosque e do mirante do Alto da Conceição. Gostou da ideia que, entretanto, morreria consigo.

Desgraçadamente, raros prefeitos do interior têm a mente aberta para os assuntos da história e da cultura, mesmo quando isso signifique a possibilidade do turismo gerador de empregos e rendas. É como se desejassem manter os pobres de Jó na dependência eterna dos favores da Prefeitura, desde o par de óculos até o caixão de defunto. Parecem supor que apenas isso rende votos.

O retorno de Maroja a Pilar foi, mesmo assim, de algum proveito. Com o primo Humberto Lucena então no comando do Congresso Nacional, ele conseguiu do presidente José Sarney a restauração da Casa e Câmara e Cadeia, onde Dom Pedro II, em 1859, concedeu beija-mão à sociedade paraibana. Mas, lastimavelmente, foi só isso.  Sem apoio local, malhou em ferro frio e morreu desgostoso. Há empecilhos que nem os santos resolvem.

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1 Comentário

  • Reply severino de maria 16 de julho de 2020 at 12:13

    Tiao e não tem prefeito aí nesse localidade não é? Esse deve limpar o furico com sabugo

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