Marcos Pires
Entre todos os trabalhos desenvolvidos no âmbito da Lies University o que mais fascina reúne um grupo de cientistas que tem dedicado todo o seu tempo a identificar mentiras. Nesta época de fake news será de suma importância.
O início dos trabalhos deu-se quase por acaso num jantar de celebração de mais um aniversário daquela centenária Universidade, quando alguém fez referência a estudos que apontavam basicamente quatro tipos de mentirosos.
À mesa encontrava-se ninguém menos que o Professor Menteur, com vários PhDs e uma série de livros publicados sobre o assunto. Sua tese principal era a de que uma mentira nunca existirá por muito tempo se o mentiroso não tiver a capacidade de criar outras mentiras periféricas para sustentar a mentira original. Se conseguisse financiamento para aprofundar a pesquisa definiria qual seria o número de mentiras necessárias para manter uma mentira original.
O velho Reitor Lügner convocou os presentes a ajudarem nessa pesquisa. Naquele momento ocorreu o que Jung denominou sincronicidade, porque à mesa também estava o PhD Bugiardo, uma das maiores autoridades internacionais em neurociências.
Os recursos foram alocados e as pesquisas encaminhadas. Agora estão em fase final e comenta-se que o número das mentiras periféricas necessárias a sustentar uma mentira principal deverá chegar a sete, porém isso pode ser mentira, para despistar interesses danosos.
Surpreendente foi o encaminhamento dado pelo ilustre professor italiano à sua parte no trabalho. Ele desenvolveu um mecanismo capaz de captar toda a memória de imagens e sons que nossos olhos e ouvidos tenham visto e ouvido ao longo da vida. Só que o altíssimo conceito da Lies University não permite que qualquer trabalho científico seja divulgado sem antes passar pelo crivo do seu compliance. Muito embora os resultados sirvam à perfeição para que os órgãos de segurança identifiquem bandidos e desvendem crimes, não se conseguiu ainda obstar a utilização de imagens e sons resgatados do passado para que cônjuges descubram traições. O pior, entretanto, é que uma suposta associação de milionários paraibanos promoveu na justiça um procedimento que visa impedir a fabricação de scanners portáteis que possam ser usados por curiosos e fofoqueiros em festas, restaurantes e bares para descobrir quais os saldos negativos bancários, prestações de automóveis em atraso e o nome dos agiotas de cabeceira dos falsos ricos daqui.
Seria o caos.
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