Meu pai morreu jovem. Ia completar 68 anos quando uma doença pulmonar o levou. Fumava, era diabético e não seguia à risca as recomendações do médico. Na semana da sua morte, arrancou cinco dentes de uma vez. E como era diabético, quase o médico não consegue estancar a hemorragia.
Mas era o seu jeito de encarar a vida.
Papai nunca se sentiu prisioneiro de regras.
Por isso foi feliz e morreu feliz.
E teve a sorte de não deixar herança cobiçada por herdeiros ávidos por dinheiro.
Eu herdei seu velho chapéu suado, Edmilson o revólver canela fina, Carlinhos o relógio de algibeira e mamãe a saudade do seu amado.
Os demais filhos herdaram o bom exemplo deste homem que soube criar a todos com ensinamentos eternos.
Filho de Miguel Lucena não era dono de coisa nenhuma. O que era de um, era de todos.
Um dia ele me puxou as orelhas por ter reclamado do irmão mais próximo por ele vestir minha camisa.
-Aqui ninguém é dono de nada. O que é seu é do seu irmão -, avisou meu pai.
E foi assim que crescemos, sabendo que família unida jamais será vencida.
Um dia papai morreu.
Eu quase morri junto.
Ele seria eterno na minha concepção.
Meu herói nunca morreria.
O amava como se ama a um Deus.
E foi por isso que adoeci da mesma doença dele.
E quase embarco para o outro mundo.
Fui salvo pelo gongo e pelos cuidados de dona Cacilda.
E continuei vivendo para continuar sentindo saudades desse homem sem igual.
Meu pai, meu amigo, meu mestre, meu tudo.
Ah como eu daria um pedaço do meu coração para tê-lo ao meu lado!
Sem Comentários