opinião

MINHA PASSAGEM PELA TABAJARA

24 de dezembro de 2023

Ramalho Leite 

Da varanda posterior do Palácio do Governo já se contemplava os primeiros raios do sol refletindo nas águas do Sanhauá. À cabeceira de uma mesa revestida com tinta dourada, o governador Pedro Gondim corria contra os prazos. A partir do dia seguinte, estariam proibidas as publicações de nomeações ou exonerações. Para encerrar a pauta entrou na ordem do dia, melhor dizendo, da madrugada, o Plano de Cargos da Radio Tabajara da Paraíba, recentemente aprovado, mas ainda não executado. Fiquei até àquela hora na defesa dos meus interesses, como todos que cercavam o governador. Jornalista sindicalizado e registrado no Ministério do Trabalho, sócio da Associação Paraibana de Imprensa e frequentando as páginas de A União e da Tribuna do Povo, ocupava a função de Oficial de Gabinete, mesmo sem nomeação para esse cargo, vez que, efetivo da Assembleia Legislativa, fora colocado à disposição do Gabinete do Governador.
As vagas de Redator da Tabajara eram poucas, mas suficientes para atender aos que já exerciam a função e com alguma folga para contemplar outros jornalistas vinculados ao governo. Foi aí que eu entrei. Nomeado Redator, cargo isolado e de provimento efetivo, só saí do Palácio depois de ver o governador assinar o meu ato e Manoel Costeira, gerente de A União, sair com ele e os demais debaixo do braço para a devida publicação no Diário Oficial. Passei a integrar os quadros da Tabajara, a partir do final de 1965. Iniciado o governo João Agripino, foi nomeado diretor o jornalista José Morais Souto que, sabendo da minha condição de estudante de direito, aproveitou-me logo como presidente da Comissão de Inquérito. Um motorista da emissora resolveu fazer uma farra no carro oficial e acabou com o veículo lá “prás bandas” de Cabedelo. Dei voltas à minha capacidade de advogado de defesa para salvar o emprego daquele pai de família, irresponsável como servidor, mas necessitado da sua única fonte de renda. Pensando na sua mulher e filhos, recomendei, apenas, uma suspensão. Meu relatório não foi bem aceito pelo Palácio e a minha carreira de inquisidor foi encerrada.
A minha vocação mesmo era o jornalismo e a política. Um ajudando a outra. Com Geraldo Cavalcanti na sonoplastia e coadjuvado por Ivan de Oliveira passei a apresentar o programa Encontro Marcado. Sempre um entrevistado de destaque na política e na sociedade, respondendo às nossas perguntas e, aos ouvintes, através de cartas enviadas durante a semana, pois telefone naquele tempo era ave rara. Do Recife trouxemos Don Helder Câmara, já naquele período em liberdade vigiada e cuja pregação causava arrepios até na farda dos milicos. O governador João Agripino estreou o programa e causou uma polêmica que ocuparia generosos espaços na imprensa. Perguntado por carta por que pagava salário irrisório a um médico, respondeu: “Pago muito a quem faz tão pouco”. A Sociedade de Medicina e todas as entidades médicas ainda vigentes protestaram. O presidente da Assembleia, deputado Waldir dos Santos Lima e o prefeito Damásio Franca foram outros entrevistados que encheram o pequeno auditório do antigo prédio da Rodrigues de Aquino. O programa durou até a entrevista de Dom Helder. Naqueles tempos de democracia consentida a presença do prelado de Olinda era um afronta.

Minha passagem pela Tabajara foi meteórica. O secretário Antonio Carlos Escorel, da Administração, instalou uma comissão permanente de acumulação de cargos. Fui dos primeiros a ser chamado. Era servidor da Assembleia e da Tabajara. Acumulação ilegal. Mesmo sob protesto, pedi exoneração do rádio. Pedro Gondim me deu o diploma de radialista, João Agripino cassou.
Ontem, estive no Museu do Radio gravando depoimento para Beth Menezes. A iniciativa da Empresa Paraibana de Comunicação, dirigida pela jornalista Naná Garcez pretende acumular depoimentos de todos os que viveram esses 82 anos da emissora oficial do Estado. Agora, transmudando-se para uma Frequência Modulada( FM). Já gravara para o mesmo objetivo em A União. A memória do rádio e do centenário periódico permanecerá nos arquivos da EPC e das redes sociais. Antes que me esqueça, lembro que manuseei uma lei, firmada pelo então governador José Américo autorizando alugar a Radio Tabajara, a “uma pessoa idônia”. Uma lei desse teor não pode ficar longe das peças do Museu do Radio.

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