Por GILBERTO CARNEIRO
O ANO É 1975. O governo do Estado de Alagoas autoriza em Maceió extração de sal-gema – uma matéria-prima usada na indústria para produção de PVC e também cloro, ácido clorídrico, soda cáustica e bicarbonato de sódio. A empresa responsável pela exploração é a Salgema Indústria Químicas de Alagoas, que depois passou a ser chamada de Braskem.
Cria-se um verdadeiro frenesi no estado das Alagoas com a geração de milhares de empregos e investimentos financeiros vultosos anunciados pela empresa responsável por explorar o sal-gema. É só prosperidade e desenvolvimento para a região. Nenhum órgão de proteção ambiental faz qualquer tipo de alerta sobre os danos ambientais irreversíveis que a extração do referido produto poderá causar no futuro pelo fato de o minério da região ser altamente solúvel, ao mesmo tempo em que há água dos dois lados: de um, uma lagoa, a lagoa do Mundaú, e do outro, o oceano Atlântico.
O ano agora é 2018. Um tremor de terra é sentido na região causando rachaduras em casas, fendas nas ruas, afundamentos do solo e crateras, sem aparente motivo. No início, as reclamações partiam do bairro tradicional do Pinheiro, mas no mesmo ano foram registradas também nos bairros do Mutange e Bebedouro. No ano seguinte, moradores do Bom Parto também reportaram danos em suas residências. Há 35 poços de extração em área urbana da capital alagoana, explorados através de um sistema arcaico ocasionando instabilidade no solo provocando surgimento de crateras, visíveis na superfície.
E estamos em 2023. Laudo técnico da Defesa Civil de Alagoas aponta a necessidade de evacuação de áreas inteiras no perímetro da mina 18 de sal-gema da Braskem que corre sérios riscos de colapsar. Ao todo mais de 60 mil famílias dos bairros Pinheiro, Mutange, Bebedouro, Bom Parto e Farol são realocadas para outras regiões de Maceió. Se se somarem a esses números os trabalhadores e comerciantes pode-se chegar a 100 mil pessoas prejudicadas pela Braskem.
Em terras paraibanas o assunto predominante na semana foi a alvissareira notícia da construção do que chamaram de Cidade Inteligente e do Porto de Águas Profundas, empreendimentos vultosos com cifras astronômicas acima de 9 trilhões de reais que supostamente serão investidos por um grupo chinês. Confesso que dois fatos curiosos me chamaram a atenção: o primeiro foi a forma escolhida para anunciar os investimentos e, o segundo, a constatação de Mataraca ser uma região rica em minério.
A lógica envolvendo investimentos privados de grande complexidade como este recomenda que investidores procurem inicialmente a autoridade política maior do Estado, no caso o governador e, consequentemente, a Companhia de Desenvolvimento da Paraíba – CINEP, visando formalizar os chamados Protocolos de Intenções. Não foi esse o roteiro utilizado pelo grupo chinês, cujo anúncio dos investimentos ocorreu envolvendo apenas o prefeito do município de Mataraca, sem a participação de agentes governamentais da esfera estadual e sem que estes agentes fornecessem qualquer explicação para a ausência no referido evento.
A região de Mataraca é rica em minério, tendo sido descoberto recentemente a IImenita, uma pedra composta por óxido de titânio e ferro com grande importância econômica. Seu uso é mais comum como minério de titânio, tendo ganho grande importância na engenharia aero-espacial devido à sua resistência. Estudos feitos por especialistas apontaram que a Paraíba, mais precisamente a cidade de Mataraca, chegou a ser responsável por 75% da produção de concentrados de Ilmenita e Rutilo em todo o Brasil.
E é justamente a exploração do minério que passa ao largo. A empresa que anunciou os supostos investimentos explora a extração do minério na região há alguns anos. Que fiquem atentas as autoridades ambientais, pois não me surpreenderia se subjacente a essa “bondade” do grupo chinês não esteja por trás uma distopia para desviar a atenção da sociedade turvando sua visão sobre os impactos ambientais futuros provocados pela extração do referido minério, reprisando o trágico desfecho ocorrido no estado das Alagoas, mesmo que em dimensões diferentes.
Parece cena do filme do momento: “O mundo depois de nós”. Um diálogo extraído é bastante intrigante. – “Eu vi, sabe? Um tempo atrás, antes de tudo isso. Observei o mercado e soube que algo iria acontecer. – Como assim? Precisamos entender os padrões que governam o mundo, aprender a ler a curva. Após tanto tempo fazendo isso, a curva ajuda a ver o futuro. Se permanecer constante, promete harmonia. Se desce ou sobe, saberemos que algo terrível se anuncia”.
E o prenúncio do futuro político paraibano não é nada animador. Basta olhar a linha sucessória do atual governo e antever em quais mãos estará o Estado a partir de março de 2026. Se está ruim, imagine como ficará. A não ser que …
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