O jornalista Fernando Caldeira escreveu um artigo perguntando a quem interessava a prescrição dos processos da Calvário. Recebeu uma resposta da ex-prefeita Márcia Lucena que merece reprodução. Márcia cobra celeridade e reparação pelo que sofreu. Vale a pena ler:
“Fernando Caldeira, vou, como vitima de lawfare, me arvorar a responder as indagações do teu artigo.
Às vezes vou falar de mim e às vezes vou falar como grupo, mesmo não representando formalmente ninguém, me sinto UMA nessa luta com os companheiros e companheiras do mensalão, do golpe, da lava-jato e da Calvário.
Primeiro, queria te parabenizar pelo interesse no assunto. É super importante ter alguém da imprensa fazendo essas perguntas, questionando a justiça e a própria imprensa.
De fato a inércia, o silêncio, a falta de interesse e prontidão, para algo tão sério, que foi super explorado na ocasião da nossa prisão, é no mínimo desrespeitoso para com toda a sociedade. Você tem toda razão!
Causa espécie, algo que gerou tanto interesse ontem, hoje, estar no mais absoluto desprezo, com juizes, um após o outro, se averbando suspeitos.
Como algo que era tão absurdo, tão escandaloso que ocupou inclusive a mídia nacional, parece não ter valor agora?
Onde estão os radialistas, blogueiros e fazedores de notícias? Porque não cobram da Justiça a agilidade do tamanho da denúncia feita?
Lembro que na audiência de custódia o juiz me perguntou se eu sabia porque estava sendo presa e quando eu respondi que não sabia e queria entender, ele rebateu dizendo que a justiça não tinha satisfação a me dar, eu que devia satisfação à justiça e à toda sociedade pelos crimes que eu cometi (segundo o juiz já na audiência de custódia, fui, perante meus familiares, amigos, imprensa e toda sociedade, considerada uma criminosa).
Fui presa, fiquei 5 dias no presídio estadual. Quando saí, por força de um HC, passei a usar uma tornozeleira eletrônica, não só eu, mas meus companheiros e companheiras também. Foram 2 anos usando tornozeleira eletrônica, presa nos limites do município e todas as noites, finais de semanas e feriados, presa em casa. Até hoje, eu, meus companheiros e companheiras, estamos cumprindo medidas cautelares. Da tornozeleira nos livramos, as demais cautelares permanecem!
O rastro de desgraça que essa operação Calvário trouxe, pode ter certeza, não acabará nunca! Eu perdi meu pai, Amanda Rodrigues e Ricardo Coutinho perderam um filho, a mãe de Estela Bezerra, após ter sido arrancada da cama para fazerem busca e apreensão em seu colchão, teve a situação de saúde tão agravada, que penetrou num profundo silêncio e se “retirou”, mesmo estando viva. São rastros que não se apagarão. Permanecerão em nossas vidas como um sinal que surge em nossa pele para sempre. Sempre terá alguém me chamando de ex presidiária e sempre terá alguém partindo do pressuposto que eu fiz algo para merecer tal coisa.
É Caldeira, o Lawfere é essa guerra que se vale da justiça, da mídia, de uma denúncia envolvendo corrupção (mas sem provas) para atirar pra matar. Mas se a vítima não morre, o que deveria ser um processo devidamente instaurado, vira tortura. Aquela tortura que era praticada nos porões da ditadura sabe? No Lawfare, acontece à luz do sol. Nas mídias sociais, nos blogs, e nos momentos que a pessoa sai de casa, pois boa parte da mídia está a serviço dessa guerra e não lhe deixa em paz.
O objetivo é apagar a vítima, acabar com sua reputação, sua história, destruir qualquer possibilidade de trabalho futuro, fazer a pessoa gastar o que não tem com advogados para se defender de algo que não fez. Isso é o lawfare.
Eu também gostaria de saber a quem interessa a prescrição da Calvário!
Mas posso te garantir que não somos nós, as vítimas, os interessados ou responsáveis por isso! Por nós, tudo isso já teria acabado e a reparação já teria sido feita!
Mas o que podemos fazer enquanto vítimas?
Seria importante acompanhar as petições dos acusados na Calvário para ver o quanto estamos nos empanhando para que nossa inocência seja provada e te garanto que não depende em nada das vítimas, dos acusados nessa operação.
Concordo que quando uma injustiça é praticada contra uma cidadã/cidadão, toda sociedade é injustiçada também. Precisamos de respostas e de compromisso por parte daqueles que podem e devem nos julgar a fim de apresentar à sociedade não só o começo, mas o fim de uma história que é de interesse de todes.
Queria aproveitar teu compromisso como jornalista preocupado com a verdade (não é de hoje que acompanho seu trabalho) e te pedir que puxe uma campanha pela marcação do julgamento, já!
Não vejo a hora (e sei que meus companheiros e companheiras têm a mesma ansiedade) de ver tudo isso resolvido, e a reparação feita.
Enquanto isso, me coloco disponível para ajudar a mídia à esclarecer ao povo da Paraíba sobre Lawfere, essa guerra híbrida que tem atingido os países ao sul do globo e que como filhote da lava-jato, se instalou na Paraíba.
Como disse, recentemente José Genuíno, vítima de lawfare por meio do Mensalão (que agora tá sendo conhecido como “mentirão”) a tortura na ditadura era física e acabava atingindo a alma, no lawfare a tortura atinge a alma e acaba no corpo. E eu ja não aguento mais!”
* Márcia Lucena (Ex-secretária estadual de educação Pb)
1 Comentário
Otimo artigo! Muito importante estarmos cobrando respostas sobre os casos de Lawfere na Paraíba! Manifesto minha total solidariedade a Ex-Prefeita exemplar que foi Márcia Lucena, pois o pesadelo nada acabou.
Não precisa ter mandato político para estar exposto ás “arrumações” do sistema judiciário, para fim de interesses individuais.
Sem Justiça, não há Democracia!