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O JOSÉ AMÉRICO QUE EU RECORDO (2)

26 de maio de 2019

Ramalho Leite

Essa campanha ao governo (1950) mexeu com os paraibanos e jamais seria esquecida, em virtude do comício da Praça da Bandeira, em Campina Grande, que terminou em tragédia com mortos e feridos. Os lenços brancos de Zé Américo e os amarelos de Argemiro ostentavam o pescoço dos seus correligionários. Até em Bananeiras essa rivalidade chegou dividindo famílias e separando irmãos. Exemplo disso foi contado por Maurílio Almeida: dona Donana, sua avó, portanto sogra de Pedro de Almeida, seu pai e candidato a deputado estadual, era irmã de Dona Dondon, avó de Clovis Bezerra, candidato dos amarelos. Certo dia, ao voltar da missa dominical, dona Donana avisou que não mais visitaria sua irmã Dondom, enquant o perdurasse a campanha política. E a razão foi explicada:
– Ela não está nem um pouco resfriada, mas usou um lenço amarelo para assoar o nariz, só para me afrontar…
Pedro Augusto de Almeida, não tivesse falecido em dezembro daquele ano de 1950, certamente, sob a liderança de Ivan Bichara, formaria na bancada americista e ingressaria como outros dissidentes da UDN, no nascente partido Partido Libertador. Sua morte fez ascender logo no primeiro dia de mandato, em 02 de fevereiro de 1951, o primeiro suplente Humberto Coutinho de Lucena que ali dava os primeiros passos para sua respeitável carreira política.
O governo de Zé Américo, na casa de um político udenista do interior, acumulou uma coleção de histórias de perseguições. Nunca ouvi boas referências. As minhas tias que puxaram o hino de Argemiro, por exemplo, foram exoneradas nos primeiros dias de governo. Hoje eu diria que se cumpriu exigências da política local, mas na minha alma de criança, ficou a marca de um governo que tirava o emprego de quem precisava.
A vida inteira, sempre olhei para o solitário de Tambaú com um pé atrás. Apesar dessa antipatia herdada do passado, lí quase tudo que publicou. E quanto aprendi com seus escritos! Sua vida é um exemplo que não poderia ser escondida das gerações que o sucederam. Por sua longevidade, seu modelo de homem público e escritor, também serviram aos seus contemporâneos. Era um vaidoso? Sim, mas tinha motivos para sê-lo.
Não tive o privilégio da sua convivência. Uma única vez fui à sua residência acompanhando o prefeito Dorgival Terceiro Neto. O município projetou uma avenida ao pé do morro do Cabo Branco, para possibilitar o tráfego de mão única na Beira Mar. Essa avenida de retorno teria que cortar um pedaço de todos os quintais das casas defronte à praia. Só tinha quintal de gente importante. O Prefeito resolveu visitar primeiro o maior de todos, e expôs ao Ministro a sua ideia e a importância da obra para a cidade. Não quero nada de graça, vou desapropriar, indenizar e pagar, explicou o edil. O ministro ouviu tudo calado, fez algumas perguntas e se satisfez com os detalhes que queria conhecer.
– Não quero pagamento. Pode lançar mão do pedaço de terreno necessário. Só quero que salve os meus pés de jabuticaba.
O prefeito lembrou de que a jabuticaba só produz depois de trinta anos.
– Sei disso, mas lhe garanto que vou colhê-las!
A aquiescência do Ministro desarmou o espírito dos demais moradores da orla. Todos concordaram com a nova avenida que terminou lhes beneficiando com uma entrada pelos fundos de suas casas,
Pelo homem que foi, nas posições que ocupou e honrou, Zé Américo levou o nome da Paraíba aos píncaros. Por isso, repito, tinha motivos para se orgulhar da sua história, daí porque, tornou célebre e até folclórica a sua extrema vaidade, mesmo tentando escondê-la permanentemente. Aqui e acolá, porém, deixava escorregar…
Quando fez as pazes com Getúlio Vargas e deixou o governo da Paraíba para ser novamente ministro da Viação e Obras Públicas, ao chegar ao Rio de Janeiro, cercado por jornalistas, foi indagado:
– Por que veio?
– Por que me chamaram. Porque precisam de mim!
Ao assumir a cadeira da imortalidade, na Academia Brasileira de Letras, não se fez de rogado:
– Penetro nesta casa como quem acha o seu lugar.

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