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O MUDINHO BABÁ

19 de julho de 2020

 

IGOR RAMALHO

Quando íamos a Bananeiras, eu sempre reservava um dia para levar papai a Borborema, sua cidade natal. Daquela vez, porém, ele não quis parar lá: “Passa direto, vamos em Serraria, quero procurar Babá.” Babá era um amigo de infância, de aventuras nos engenhos e plantações de cana. Apesar de mudo, não havia entre eles falha na comunicação: se entendiam muito antes de o povo falar em libras… “Não é possível que em Serraria ninguém conheça Babá”, foi comentando no caminho.

O primeiro a quem perguntamos já deu o endereço: “O mudo? É na rua por trás da cadeia, podem ir.” Fazia mais de 20 anos que papai tinha visto Babá, mas assim que entramos na rua, de longe, já apontou: “Olha ele na calçada!” Babá o reconheceu tão logo parei o carro, e não conteve a emoção: “Bááá, bááá, bááá, bááá…”, disparou a gritar o som que, só naquele instante eu soube, o caracterizava. A zoada foi tão grande que metade da rua saiu às portas, com a certeza de que alguém estava matando o mudo.

Babá queria que papai descesse, queria abraçá-lo, mostrar-lhe a casa, os filhos… Não sabia, claro, da paraplegia. Foi aí que, recordando o antigo entrosamento, papai tentou lhe explicar que não andava. Fechou o punho da mão direita e, com indicador e dedo médio, fez movimentos simulando caminhada. Depois, jogou a mão mole sobre o painel do carro, demonstrando, a seu modo, imobilidade. Babá olhava atento, e, tendo entendido, fez cara de surpresa, levantando os ombros e pondo as palmas das mãos para cima: queria saber por quê. Papai então simulou a queda do coqueiro. Começou a gesticular rapidamente com os braços e o tronco, jogando-os para frente e para trás, emitindo sons de esforço cada vez mais altos (parecia os esquiadores que eu via nos filmes…). Aí imitou uma queda e parou. Babá se deu por satisfeito, e, choroso, ainda pôs as mãos no peito em sinal de compaixão.

Saindo de lá, após quase uma hora, papai comentou: “Eu pensei que Babá sabia que eu tinha caído de um pé de coco…” Eu respondi: “Vai continuar sem saber, porque, com aquela mímica, ele vai espalhar por aí que o amigo caiu foi de um cavalo.”

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