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O USO DA GRAVATA

1 de julho de 2018

                                              

A primeira vez que botei uma gravata no pescoço ia fazer a também primeira comunhão. Era de lacinho preta, bem arrumadinha, combinando com a vela. Mamãe seguiu as orientações de João Mandu, aquele que Zé de Biu, meu amigo de infância, identificava como “quase padre”. Ainda hoje guardo comigo a foto: eu e Bibiu meu irmão mais novo, ambos de branco segurando a vela com a palavra “INRI” posta pela bem arrumada Alice de Zidoro perto da nossa munheca, e a gravata preta, reluzente, dando ares de nobreza ao singelo ato de comungar pela primeira vez.

Daí em diante, passei muito tempo sem usar a dita cuja. Via, de longe, quando Chico de Lúcio Fráuzio botava a sua para ir à igreja nas tardes domingueiras. Ele se aprontava com esmero para ir à missa e era o único na cidade que comparecia ao ato religioso em passeio formal, botando na sarjeta até os ditos ricos da terra, que iam ouvir os sermões do Padre Anastácio em mangas de camisa.

Aqui em João Pessoa, por força das obrigações, comecei a botar paletó quando as lides advocatícias assim o exigiram. Na primeira vez, lembro bem, vesti um terno azul marinho, recheado com uma camisa branca e uma gravata laranja. Desci a rampa de casa, peguei um onibus lotado no Funcionários II e segui para o centro. Apesar do aperto do onibus, notei que uma dama me olhava. Achei logo que estava destroçando o coração dela. Coisa de convencido, que se acha bonito somente porque botou um abafa banana com gravata laranja. Fiquei a olhar pra ela e ela, enquanto me olhava, dava um jeito de chegar mais perto. Até que chegou. Encostou a boca no meu ouvido e eu esperei o beijo.”Que mulher avexadinha!”, disse para mim mesmo. E ela, quando a boca roçou a orelha, fez a pergunta que a aperreava desde longe: -O irmão congrega aonde?”

De lá para cá muitas gravatas se passaram, incontáveis paletós entraram em desuso pelo excesso de uso, até que, certa vez, em Custódia, parei numa churrascaria de beira de estrada para almoçar. Vinha de Monteiro indo para Princesa. Não vestia paletó, só a camisa de mangas compridas e a gravata vermelha, cor de sangue. Sentei-me à mesa, pedi a comida, comecei a degustá-la quando vi a garçonete se aproximar solícita, para dizer-me em tom de confidência:

 -O senhor pode ficar tranquilo que aqui motorista de onibus come de graça”.

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