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       O voto de volta

11 de março de 2018

Marcos Pires

Quando minha secretária Maria anunciou o próximo cliente a ser atendido eu tive a impressão de já ter ouvido aquele nome antes, o que se confirmou quando o senhor R. acomodou seus quase 150 quilos à minha frente. Era o mesmo que anos antes tentara me contratar para processar a Caixa, porque havia acertado na loteria, mas recusavam pagar seu prêmio. Na verdade, ele havia se equivocado porque teimava em computar nos números vitoriosos a quantia que pagara pelo bilhete.

Agora pretendia processar nada menos do que a Justiça Eleitoral, e o pior, queria processar antes que o fato que temia ocorresse. Acho que esse Habeas Corpus preventivo de Lula deu azo a muitas ideias exóticas. Explicou-me basicamente que não suportava mais ser seguidamente surrupiado no que tinha de mais garantido pela Constituição, o seu voto. A cada eleição roubavam seu voto e ele ficava sem ter a quem reclamar.

Confesso que de início pensei se tratar de alguma fraude eleitoral, urna eletrônica defeituosa, por aí. Nada disso, ele explicou.

“- Doutor, a cada eleição a Justiça Eleitoral deixa os candidatos fazerem a propaganda deles, depois coloca os nomes e até os retratos nas urnas e a gente vai lá e vota pensando que a justiça garante nossa escolha. Pois bom; depois de eleitos a justiça dá até um diploma a esse pessoal, não é? Só que mais tarde essa mesma justiça que me fez acreditar que os candidatos em quem votei eram elegíveis, vem e cassa o mandato dos danados. Eu nem quero saber se eles eram inocentes ou culpados. Acho mesmo que depois dessas lava-jatos são quase todos safados, mas se foi a justiça quem ofereceu o nome deles como se fossem pratos num cardápio e eu escolhi o meu, como é que pode me mandarem botar pra fora o que eu escolhi e comi dizendo que a comida (meu candidato) estava estragada? Se fosse num restaurante me devolveriam ao menos o valor que paguei pelo prato, mas cadê que me devolvem o voto que perdi por culpa deles?”

Procurei mostrar a ele que a justiça se limita a executar as leis que os políticos votam, mas ele me interrompeu: “-Ah, é? Então era só trabalhar mais para no dia da eleição não ter nenhum candidato pendurado. Nos Tribunais não tem suplentes? Então botasse esse povo pra trabalhar de dia e de noite até terminar o serviço, como numa empeleitada.” Meu último argumento era imbatível: “- Mas meu senhor, como a justiça pode devolver um voto de uma eleição que já se acabou?”

“- Apôi então diga aí na sua petição que se isso acontecer de novo eu quero o direito de poder votar duas vezes na eleição seguinte”.

Assim fica difícil.

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