1 – Sábado! O que tem o sábado de tão especial? Muitos dirão: praia! E é um bom dizer. Eu tive meus sábados e domingos de praias. No Cabo Branco, na Toca do Bobó, fazíamos ponto. Os meninos ficavam soltos na água, a mulher estendia a toalha na areia e ficava a namorar com o sol, que lhe queimava a pele. Eu ficava no Bobó batendo o papo com a cachacinha e com aquele caldo de feijão com camarão tão especial.
2 – Não havia Lei Seca e não avaliávamos o risco de sair depois de tudo dirigindo o carro Cabo Branco acima, até chegar a um farol que se podia visitar de carro sem ter medo de derrubar a barreira. Depois, casa, banho para tirar o sal, almoço e cama. Os meninos nem zoavam, de tão satisfeitos com o excesso de mar e correria.
3 – Antes disso, bem antes mesmo, nos tempos de sertão, o sábado era feira livre. O quebra queixo dos Arapapacas virava sanduiche com pão francês. A turma comia e depois bebia água de caneco, tirada do pote de barro, cuja boca Luizinho Arapapaca cobria com uma toalha da saco para proteger a água dos ventos carregados de poeira.
4 – Mas tinha mais a se ver. O homem da jaca vendia jacas enormes, que a turma comia por entre as pedras da Lagoa, engolindo os bagos e cuspindo os caroços na terra. E as mangas espadas, doces como açúcar, eram chupadas por Buziga de Zidoro como se fossem os famosos manjares celestiais falados na missa pelo velho padre Frei Manoel.
5 – Uns preferiam os bares. O de Arlindo, na entrada da feira, o de Maria do Ó, que vendia peixe frito pescado no Açude Velho, mais pra cima, na Rua Grande, o de João França reunia a elite endinheirada, e, descendo pelo beco do São Roque, Zé Brejeiro recebia os cachaceiros,atraídos pelo famoso Pau Dentro e pelo Caldo de Mocotó.
6 – A turma da safadeza se postava nas imediações da Lagoa “pescando” matutas ávidas por um carinho. E os cheiros de amor invadiam os céus do sertão, cheiros de lavanda, de incensos comprados no banco de Joaquim Zuca, de brilhantinas que escorriam pela testa, derretidas pelo sol, e de suores expelidos pelos corpos agitados no frenesi dos amassos.
7 – O ponteiro do tempo correu para mais adiante e agora surgem as imagens de sábados dançantes em românticos assustados. Radiola, discos, sons de amores e pares desfilando pelo salão quase escuro, rostinhos colados, suspiros quentes bafejando nucas arrepiadas de desejos não confessados e namoros surgindo sem precisar pedir ou suplicar. Os corações, juntinhos, colados, falavam uns para os outros.
8 – Havia a missa, depois dela os passeios pela rua maior. Rapazes e moças, subiam e desciam num desfile calculado, olhares se trocavam, sorrisos discretos falavam dos desejos e dos ciúmes. Uns, mais afortunados, andavam de mãos dadas, envoltos num clima de sonhos.
9 – E as serenatas varavam a madrugada, somente encerrando quando o sol de domingo botava a cara no alto da serra avisando que estava na hora de dormir para pegar a missa matinal a ser avisada dali a pouco pelo sino de Dão Mandu.
10 – O mar continua o mesmo, mas sem a Toca do Bobó. A feira cresceu, ficou rica, expulsou de suas vielas os bares de Maria do Ó, de Zé Brejeiro, de João França e de Arlindo. Não há mais assustados. Bartolomeu foi morar no céu.
11 – E agora lá se vão meus abraços sabadais para Marçal Lima Neto, Wilma Marques Lima, Felipe Silvino, Venancio Medeiros, Ricardo Lucena, Ariano Vanderley, Marcos Holmes Madruga, Chico Franca, Fernando Milanez, Marcos Pires, Johnson Abrantes, Francisco Ferreira, Ricardo Sérvulo, Odon Bezerra, Harrison Targino, Marcos Maivado Marinho, Chico Pinto, Jackson Bandeira, Rubens Nóbrega, Geordie Tampa de Furico Filho e Fred Menezes.
12 – Na época em que o topless era tabu, o jornalista Chico Maria fazia um programa de entrevistas na TV Cabo Branco, e o entrevistado do dia era o arcebispo Dom Helder Câmara. Circunspecto, jeitão conservador, o jornalista Chico Maria foi direto na pergunta:
– Dom Helder, o que o senhor acha do topless?
Dom Helder, de voz serena, suave, mas firme, respondeu:
– Meu filho, eu me preocupo com quem não tem roupa para usar, mas com quem tem para tirar, não me importo.
1 Comentário
Essa resposta de Dom Hélder Câmara foi cirúrgico, inclusive para o jornalista curioso rsrsrsrs