Por Tiago Angelo, Conjur – Integrantes do Ministério Público Federal não podem divulgar como notícia institucional informações que estão em segredo de Justiça. Com base nesse entendimento, o Conselho Nacional do Ministério Público aplicou nesta segunda-feira (19/12) a pena de suspensão de 30 dias ao ex-coordenador da “lava jato” do Rio de Janeiro, Eduardo El Hage.
Com a decisão, o procurador ficará impedido de participar por cinco anos de forças-tarefas, grupos especiais ou mesmo de ocupar cargos de confiança no Ministério Público Federal.
Segundo a maior parte do colegiado, houve divulgação de informações em segredo de Justiça. Venceu o voto divergente do conselheiro Daniel Carnio. Ele foi seguido por Rogério Magnus, Rodrigo Badaró, Jayme Oliveira, Oswaldo D’Albuquerque, Otavio Luiz Rodrigues Jr., Rinaldo Reis Lima e Engels Augusto Muniz.
De acordo com Carnio, o MPF do Rio divulgou a notícia sem que houvesse decisão judicial derrubando o sigilo de procedimentos que tramitavam em segredo. Ele também criticou a atuação dos procuradores. Para ele, a “lava jato” publicava denúncias como forma de instrumentalizar a opinião pública e pressionar o Judiciário contra alvos da operação.
“Pelo que pude perceber, essa violação se insere em um contexto que torna a situação mais grave, porque se mostra um padrão em outras forças-tarefas: a divulgação da denúncia antes de qualquer decisão do judiciário como forma de instrumentalizar a opinião pública e pressionar o Poder Judiciário. Essa violação se insere dentro deste contexto. Isso afeta sim a dignidade da função do MP e da Justiça”, disse.
“Por conta da aplicação concreta do princípio da igualdade, penso que devemos excluir a pena de demissão e limitar a todos a pena menor”. Com isso, a pena de demissão foi convertida em suspensão.
Os demais procuradores e a promotora de Sergipe foram absolvidos. O CNMP entendeu que não há evidências de que eles participaram da divulgação da notícia.
“Houve violação de sigilo. As investigações corriam sob sigilo, a denúncia foi originada no bojo dessas investigações. Não cabe ao MP decidir se levanta ou não o sigilo. Houve a divulgação dessa denúncia antes que houvesse qualquer decisão judicial [levantando o sigilo]”, prosseguiu Carnio.
Voto relator
Para o relator do caso, Ângelo Fabiano, não houve a divulgação de informação em segredo. O conselheiro entendeu que a notícia divulgada no site da Procuradoria da República no Rio se restringiu a narrar a denúncia, enquanto estavam em sigilo só as investigações.
Ele, no entanto, votou pela aplicação da pena de censura contra El Hage e Gabriela porque o conteúdo da notícia fazia juízo de valor contra os denunciados e induzia o leitor a entender que os políticos eram culpados antes mesmo de haver qualquer decisão condenatória.
“Os termos incisivos utilizados contribuem para que o leitor comum atribua aos denunciados grau de culpa incompatível com o estágio das apurações. Ademais, verifica-se que o momento escolhido para a divulgação causou toda a confusão, gerando inclusive o entendimento de revelação de assunto sigiloso, que poderia ser evitado sem qualquer prejuízo ao interesse público se os processados tivessem aguardado o recebimento da peça acusatória”, afirmou.
Ele sugeriu que a Procuradoria-Geral da República uniformize em todo o país um modelo de comunicação em que não haja juízo de valor sobre investigados e que não induza o leitor à antecipação de culpa.
O caso
Membros do MP que atuavam na “lava jato” denunciaram os senadores do MDB Romero Jucá, Edison Lobão e seu filho Márcio Lobão, em março de 2016, por supostos crimes na construção da Usina Angra 3. À época, havia medidas cautelares sigilosas em andamento. Porém, após um dia, o site do MPF noticiou o oferecimento e detalhes das denúncias. A Justiça Federal no Rio reforçou o sigilo dos processos poucos dias depois.
Em junho de 2021, a Corregedoria Nacional do Ministério Público propôs a abertura de processo administrativo disciplinar (PAD) contra os envolvidos. Segundo o órgão, os lavajatistas descumpriram o seu dever de sigilo ao fornecer os dados das denúncias à assessoria de imprensa do MPF.
A defesa dos denunciados, feita pelo advogado Fabio Medina Osório, argumenta que a própria investigação dos então senadores estava sob sigilo desde 2017. Já a defesa dos procuradores no processo, a cargo do advogado Saul Tourinho Leal, alega que a juíza do caso afirmou não haver decretação de sigilo.
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