Germano Romero
Jerimum do bom, macaxeira, inhame, frutas, mercearia, era tudo que Bigu expunha em sua Bodega da Paz, nas manhãs de sol. De lá, quase se via o mar. O mar de Jacumã. Bons tempos…
Café e banho tomados, a passadinha em Bigu, sob pretexto de comprar frutas, era certa. Muito mais para desfrutar amabilidades, não expostas nas prateleiras, do que por qualquer abacaxi ou jaca, suculentas que fossem.
O rústico predominava. O balcão de madeira separava os ambientes, mas unia conversas bem-humoradas, deglutidas com goles da água que passarinho não gosta.
Todos os chapéus subiam em reverência à sua chegada. Era um bom dia de verdade. Dado com o fervor da sinceridade e o prazer do reencontro, quase semanal.
Anos se passaram, a idade aquietava, acomodava o corpo, mesmo com todo o estímulo de uma imaginação tão sábia, à luz das manhãs. A bodega fazia-se mais distante. Dos olhos e das pernas. De carro, nem sempre.
Mas Bigu, o homem simples, continuava ali, atrás do balcão, e cá no coração do cronista. Virou até uma crônica. Certa vez, lá voltou com o recorte do jornal impresso e foi uma festa. Uma rodada de brindes e chapéus ao ar. Uma crônica sobre Bigu!
E o tempo andou mais uma légua. Anos depois, a manhã chamou às lembranças. Num breve passeio de carro, paramos na Bodega da Paz. Papai ficou no carro.
“- Ei, Bigu, tem uma surpresa ali para você”. Os olhos brilharam com um espanto sabido: “Só podia ser ele, Dr. Carlos”. Quando o avistou, o olhar já se molhava. Mostrou-me os braços com os pelos arrepiados. Que emoção! E que amizade. Espontânea, verdadeira, sem nenhum interesse.
O tempo avançou mais e alcançou o desenlace do cronista. No velório, manhã cedo, o corpo na sala ainda vazia, avisto Bigu. – “Meu amigo, que surpresa, você soube… que bom vê-lo aqui. Entre”.
No esquife, uma saudação muda, sem sorrisos, sem chapéus ao ar, mas, sem sombra de dúvida, com regozijo d’alma. Até hoje.
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