opinião

RICARDO NÃO TEM PAZ: AGORA É A VEZ DO TCE

4 de junho de 2021

 

FLAVIO LÚCIO VIEIRA 

Ricardo Coutinho virou um homem marcado para morrer na política paraibana. Depois que deixou de ser governador, uma obsessão parece que tomou conta dos grupos políticos conservadores, majoritariamente de formação familiar-oligárquica: evitar que o ex-governador participe de novo de eleições.
Nos dois anos que se seguiram ao fim do mandato de governador (2011-2019), uma campanha para destruir a reputação de Ricardo Coutinho, jamais vista na Paraíba, ganhou a forma de uma implacável caçada, campanha que articulou os velhos esquemas políticos dentro e fora das Instituições, sobretudo na imprensa corporativa onde velhos inimigos salivaram de prazer ao sentirem o cheiro da oportunidade da vingança sempre adiada.
Assim como a Operação Lava Jato uniu todos eles na tentativa destruir o ex-presidente Lula, usando os meios judiciais disponíveis para afastá-lo do povo e das eleições, na Paraíba criaram a Operação Calvário, cujo DNA assumidamente lavajatista da operação tabajara se revelou desde as primeiras ações: intimidade do MPPB com certos meios de comunicação, que tinham acesso “em primeira mão”, às operações. O estardalhaço quase uníssono do restante da imprensa que se seguia visou sempre a condenação, o julgamento antecipado do eleitor, que, como se sabe, prescinde de julgamentos formais para enviar ao hades político lideranças que não rezam na cartilhas do familismo oligárquico — aliás, a semelhança é tamanha que a imprensa cuidou logo de festejar, no fogo da Calvário, o nascimento do Deltan Dallagnol e do Sérgio Moro paraibanos.

Essas semelhanças entre as operações curitibana e paraibana de tão evidentes não poderiam passar despercebidas no novo ambiente político, marcado pelo florescimento do bolsonarismo, que continua a vicejar, carcomendo por dentro as Instituições da República — ontem foi a vez do Exército, que se dobrou ao presidente e não puniu um general que desrespeitou flagrantemente as normas das Forças Armadas participando de ato político. À semelhança dos processos do ex-presidente Lula julgados em Curitiba, anulados pelo STF porque Sérgio Moro não era o juiz natural, O ministro Gilmar Mendes determinou, no final de maio, que um dos processos que o ex-governador Ricardo Coutinho responde na Operação Calvário, seja remetido à Justiça Eleitoral, o que deve acontecer com os outros.
A justificativa de Mendes não poderia ser mais pueril não fosse esse ambiente infectado pelo bolsonarismo: “Nessa linha argumentativa, fundamenta-se a importância do respeito à garantia constitucional do juiz natural e da devida observância dos critérios constitucionais e legais de fixação da competência como direitos fundamentais que tocam a liberdade individual e devem ser resguardados por esta Suprema Corte”.
AGORA É O TCE?
Pois bem, a decisão, como era de se esperar, causou grande alvoroço na Paraíba. Na esteira dessa decisão, que pode alterar os planos políticos de muita gente, surgiu uma nova esperança para aqueles cujo terror é enfrentar Ricardo Coutinho nas urnas. O Tribunal de Contas do Estado da Paraíba, ele próprio vítima das suspeitas da Calvário, que acusou “parcela veemente” dos seus conselheiros de, segundo o Ministério Público da Paraíba, “encobriram, ocultaram e potencializaram” “condutas delituosas” tendo eles exercido “papel central” no “modelo de negócio empresa criminosa”. Tudo isso pode ser lido na denúncia oferecida pelo MPPB à Justiça paraibana.
Pois não é que o TCE reprovou, em fevereiro último, as contas do ex-governador Ricardo Coutinho? O fato é por só estranho devido ao absoluto ineditismo da decisão, pois jamais, em tempo algum, qualquer governador teve suas contas rejeitadas, o que inclui Wilson Braga, Tarcísio Burity, Ronaldo Cunha Lima, José Maranhão, Cássio Cunha Lima. E mais ainda quando desconsiderou critérios utilizados em julgamentos anteriores, como foi o caso dos adiantamentos, prêmios e outras vantagens pagas aos profissionais do magistério, incluídos no percentual mínimo estabelecido em lei de 60% para Remuneração e Valorização do Magistério. Como já adiantamos, segundo os advogados do ex-governador, essa situação que já havia se repetido no julgamento das contas de outros governos e nas do próprio Ricardo Coutinho. Ora, como julgar ilegal uma prática administrativa reiterada ao longo dos governos e já aprovada pelo próprio TCE?
Mais ainda. Em nenhum momento, segundo os advogados do ex-governador, foi colocado em questão se o valor (vinte e quatro milhões de reais) foi realmente pago aos professores e se foram utilizados como incentivo a esses profissionais. Em qualquer lugar do mundo, prêmios, adiantamentos e gratificações são considerados estímulos oferecidos pelo governo para o melhorar o desempenho do professor em sala-de-aula e incentivá-lo à qualificação, e considerar que não se trata de investimento é absolutamente injustificável e uma tese jurídica que não se sustenta.
Mais grave ainda foi o Ministério Público apontar questões formais relacionadas a empenhos, e que nunca haviam sido consideradas pelo TCE para julgar contas anteriores, e serem agora não só levantadas, como consideradas pelo TCE para justificar a não contabilização dos valores apontados como investimento em valorização do magistério
Na mesma esteira, outro absurdo risível foi constar no parecer do conselheiro Antônio Gomes Vieira Filho a “persistência não justificada” dos chamados codificados. Ao reprovar as contas do ex-governador, o Tribunal de Contas do Estado desconsiderou o fato de que Ricardo Coutinho foi o primeiro a adotar medidas para reduzir o número de servidores contratados sem concurso público no estado, redução que pode ser comprovada em números: só em 2011, por exemplo, houve uma redução de 31,6% desses contratos, ao passo que, como é do conhecimento de toda a Paraíba, aumentou significativamente a contratação por concurso público de servidores efetivos.
Se não bastassem essas mudanças nas regras, o fato do TCE/PB reabrir a discussão das Prestações de Contas de RC já aprovadas, por conta dos da Operação Calvário, sem que nenhuma sentença de mérito tenha sido até agora proferida, viola antes de tudo o direito à presunção de inocência e colabora, como consequência, para a campanha que pretende produzir julgamentos antecipados.
É impossível não lembrar da manobra que o Tribunal de Contas da União utilizou para justificar a desaprovação das contas da ex-presidenta Dilma Rousseff, as nefastas pedaladas fiscais, que ensejaram o pedido de impeachment, processo que o honestíssimo então presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, aceitou abrir. Todos os ex-presidentes anteriores a Dilma Rousseff usaram do mesmo expediente, que se remuia a atrasar repasses aos bancos públicos pelo pagamento de programas sociais. A “mudança de interpretação” justificou a desaprovação das contas.
Como diria minha avó, são todos ingredientes da mesma sopa! Eu diria banquete: o banquete das oligarquias.

 

Você pode gostar também

Sem Comentários

Deixar uma resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.